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Discos & Cassetes – Ulisse Dapa

Em 1974, eu era um rapazola com 10 anos de idade, que ficou muito feliz por naquela quinta-feira, dia 25 Abril, não ter tido aulas e poder ir brincar na azinhaga onde morava, juntamente com a grupeta de miúdos dos prédios vizinhos.

Mas aquele dia foi diferente. A minha mãe, preocupada, não me deixou ir para a rua brincar, pois a rádio naquele dia não passava música e as pessoas andavam num alvoroço na rua. Gritos e vivas à liberdade ecoavam em todo o Bairro Lopes até às ruas adjacentes. 

Os dias que se seguiram ao dia da revolução foram intensos e confusos, mas marcantes. Lembro-me que as pessoas pareciam mais descontraídas e alegres. Durante alguns tempos pareciam viver em permanente êxtase.

Surgiam na boca das pessoas expressões e palavras novas, que nunca tinha ouvido.

Também na rádio, a minha companhia das noites em que não podia brincar com os meus amigos, se ouviam músicas diferentes.

Agora, eram “Os Vampiros” do Zeca Afonso passava na rádio e “Tanto Mar” de Chico Buarque, celebrava a Revolução dos Cravos. As ondas hertzianas inundavam as rádios com as músicas de intervenção e com os poemas de Ary dos Santos e Natália Correia.

O que fazia falta era animar a malta, como dizia a canção do Zeca. Porém a música que me marca profundamente essa época foi o tema de Ermelinda Duarte, “Somos Livres”, que ouvi ao vivo no ginásio da escola Dona Luísa de Gusmão, na Penha de França.

Mais tarde, já o período revolucionário se tinha dissipado, a vida das pessoas ia-se ajustando à nova realidade, onde a liberdade conquistada já não se celebrava a cada esquina, mas outras preocupações ocupavam o dia-a-dia dos portugueses.

Afinal de contas toda a sociedade, a nível económico e social se preparava para reajustar aos novos tempos. Mas a música, essa, mudava e chegava aos meus ouvidos como uma brisa fresca. As músicas de intervenção deram espaço às novas músicas que chegavam às rádios diariamente, agora sem qualquer tipo de censura.

Se muitas das minhas memórias de infância e juventude não são hoje tão definidas e detalhadas, a primeira vez que ouvi um disco em casa duma colega de escola está-me bem vincada.

Foi algures entre 1977 e 1978, que aproveitando um “furo” ou a falta dum professor, um pequeno grupo decidiu ir até casa duma colega ouvir uns discos.

Não sei se foi o primeiro disco que ouvi nesse dia, mas foi certamente o que mais me marcou: Crime Of The Century, dos Supertramp.

Ouvimos o álbum inteiro e foi esse disco que me abriu as portas para tudo o que a partir daí iria acontecer em termos da minha relação e paixão pela música. Poucas vezes me senti tão arrebatado a ouvir um disco como nesse dia.

Aconteceu um pouco mais tarde, com The Dark Side of The Moon, dos Pink Floyd. Ambos os álbuns ocupam o primeiro lugar na minha playlist pessoal.

Nessa altura, o rádio que tínhamos em casa foi substituído por um rádio com leitor e gravador de cassetes da SILVANO. Talvez fosse da Grundig ou da PHILIPS, não tenho a certeza. A única certeza é de que tudo mudou.

As cassetes permitiam criar as nossas playlists, mesmo quando gravar uma cassete “limpa” fosse um processo difícil e demorado, pois era muito difícil gravar uma música sem que esta não tivesse interferências de locução ou de publicidade.

O melhor horário para gravar as músicas era durante os programas nocturnos, e claro está, duramente o tempo de emissão do programa “Quando o Telefone Toca”. Descobri que a noite tinha muitos programas interessantes, com música que não passava durante o horário diurno.

Com um pequeno lote de cassetes gravadas e um leitor de cassetes os fins-de-semana eram sempre animados, com pequenas festas em casa de amigos, ou num qualquer espaço livre que nos servisse para podermos ouvir aquelas músicas, dançarmos um pouco e socializarmos.

E por vezes surgiam aquelas oportunidades únicas, de fazermos uma festarola com mais gente do que habitual, na casa dum amigo, cujos pais se encontravam fora durante o fim-de-semana. Discos e cassetes e muita bebida faziam parte do arsenal. E se tudo corresse bem, no final, a obrigatória sessão de slows ao terminar a noite.

Se os discos eram caros e difíceis de comprar, as cassetes, relativamente baratas, permitiam que pudéssemos ouvir as músicas que mais gostávamos a qualquer hora, fosse em casa, numa qualquer fábrica, numa festa de estudantes ou num Ford Capri 3000 de cor garrida, encostado ao paredão da Avenida Marginal.

E até aqui chegamos hoje com mais uma fantástica história da vida do Ulisse Dapa.

Tens de deixar o teu like abaixo em forma de apoio a que ele continue a escrever.

Muito obrigado Ulisse e até para a semana.

Partilha comigo tu também a tua história, em que podes me escrever por aqui.

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