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Os dias da Radio – Ulisse Dapa

Hoje apresento um grande Artista Portugues, é Dj, e partilhou comigo algumas das suas memorias, Ulisse Dapa.

Falar sobre o DJing e das minhas memórias, obriga a que faça um preambulo, para situar quem lê estas linhas, numa realidade muito diferente da actual, para que possa entender as dificuldades e vicissitudes que passaram todos os que se iniciaram nestas lides, por volta dos finais dos anos 70.

Nasci em Lisboa em 1963.

Nessa época, Lisboa era uma cidade bem mais pequena, rodeada de quintas e hortas, fazendo lembrar aos que entravam e saiam da urbe, que a grande cidade para onde vieram, cheios de ilusões duma vida melhor, fugindo ao trabalho duro do campo, não lhes oferecia o prometido nem o sonhado, obrigando-os muitas das vezes, para subsistir à vida miserável, escondida por detrás do silêncio das portas semiabertas dos bairros populares ou nos bairros de lata que cresciam nos limites da cidade e onde as crianças brincavam descalças nas ruas de terra batida, esperando por um futuro melhor, que tardava em chegar.

Nessa altura, Benfica, Olivais,  Lumiar e Belém delimitavam a cidade, cujas zonas nobres se situavam na Avenida de Roma, nas avenidas novas e junto à Estrela.

Os bairros de Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa eram denominados bairros populares, onde as classes mais humildes viviam, com famílias muito numerosas, onde várias gerações coabitavam no mesmo espaço.

Não havia turistas nas ruas, nem lojas de conveniência. Havia leitarias, padarias, mercearias, peixarias, carvoarias e tabernas.

Era uma época de muita pobreza, em que a rádio era a única companhia para a maioria dos portugueses, não obstante a televisão tivesse começado com as suas emissões regulares em 1957. Ter um aparelho de TV era um luxo que poucos conseguiam ter.

Os noticiários, os relatos de futebol, as missas de domingo, os programas de música ligeira ou clássica e até as radionovelas, chagavam-nos através das frequências hertzianas. 

Existiam poucas rádios. Rádio Clube Português, Emissora Nacional, Rádio Renascença são algumas das que me lembro e julgo que poucas mais havia. Eram rádios nacionais e as rádios regionais ou locais não existiam e ainda muito faltava para que viessem a ser uma realidade.

A música que ouvíamos nas rádios eram os sucessos da música portuguesa da época, e os êxitos da música estrangeira que chegava a Portugal, sempre com semanas de atraso.

Lembro-me, desde muito criança, gostar de música e um dos meus momentos preferidos do dia era, ao cair da noite, escutar com a minha mãe o programa “Quando o Telefone Toca”, um programa de discos pedidos, apresentado por Matos Maia, no Rádio Clube Português.

Os artistas mais populares, nacionais e estrangeiros passavam quase que diariamente naquele programa. Demis Roussos, Julio Inglesias, José Cid, Charles Aznavour, Dalida, Joe Dassin, Sylvie Vartan, Adamo, Nicolleta, Claude François, Carlos do Carmo, Amália, Alfredo Marceneiro, Tony de Matos e muitos mais entravam diariamente nas nossas casas, pela rádio, fazendo-nos sonhar, através das suas melodias.

Naquela altura, em Portugal, as músicas portuguesas e francesas eram dominantes. Os Beatles, os Rolling StonesCreedence Clearwater Revival, ou os The Animals eram alguns dos grupos que traziam até nós a música anglo-saxónica dessa época longínqua. 

Os discos eram caros e muito mais caros eram os gira-discos, que naquela época apenas faziam parte do mobiliário da classe média e dos mais abastados.

Alguns equipamentos, mais luxuosos integravam colunas embutidas e rádio, com as frequências AM e FM, que naquela época era pouco utilizada e que mais tarde veio a ser a frequência de eleição da radiofonia nacional.

Vivendo em ditadura, tudo o que chegava às rádios, fossem notícias ou músicas, era previamente passado pelo crivo dos censores, funcionários do Governo que decidiam se o teor das notícias, ou as letras das músicas não ofendiam o Estado, a Igreja e a Moral e os Bons Costumes.

Também os livros e os discos eram objecto da censura de estado e esta era a realidade em Portugal, quando nasci e que se manteve até Abril de 1974.

Num país onde cerca de 30% das pessoas não sabia ler nem escrever, e outros tantos teria, na melhor das hipóteses feito a 4ª classe, a cultura, em todos os seus formatos, era apenas para uma pequena franja da sociedade portuguesa.

Não havia clubes nocturnos, nem discotecas. Havia boates, uma espécie de clubes nocturnos, onde se poderiam encontrar algumas “senhoras disponíveis”, com pistas de dança exíguas e onde a música de dança era pré-gravada, em bobines ou em discos.

Estes espaços apresentavam por vezes espectáculos, com pequenas bandas ou solistas. Eram locais essencialmente citadinos, pouco acessíveis e maioritariamente de baixa reputação.

Algumas destas boates, contudo, ganharam reputação pela qualidade e refinamento, como foi o caso do Maxime e do Ritz Club, locais frequentados por artistas e por uma certa elite cultural.

O português comum não frequentava boates. Na melhor das hipóteses iria a uma casa de fados, ou a uma revista – uma espécie de teatro de variedades, com pequenos sketchs de sátira social –, podendo também frequentar clubes de bairro, ou sociedades filarmónicas, onde normalmente, aos fins-de-semana se realizavam matinés e soirées dançantes, com música pré-gravada ou grupos de baile. Um dos clubes mais conhecidos e afamados de Lisboa era a Sociedade Filarmónica Alunos de Apolo, em Campo de Ourique, cuja reputada escola de danças de salão cativava muitos jovens. Aquela colectividade, foi durante muito tempo o ponto de encontro para todos os que desejavam dar largas à vontade de dançar e desfrutar dum bom ambiente.

Era esta a realidade em Portugal Continental,  na década de 60.

Até aqui ficamos com algumas das melhores memorias de este grande artista.

Mantenho o convite feito de voces poderem ter o vosso espaço no meu blog, animo-te a ver o artigo A minha primeira memoria, e a também participar no meu blog, partilhando com os teus amigos.

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